sexta-feira, 15 de junho de 2012

UM EXEMPLO QUE A GUINÉ-BISSAU NÃO DEVE SEGUIR ,MASSACRE DE RUANDA,COMO ACONTECEU,POR QUE ACONTECEU


"Imediatamente antes de rachar o crânio do mecânico de 23 anos", relatou a revista U.S.News & World Report, "um dos agressores disse a Hitiyise: 'Você tem de morrer porque é tutsi'".

ESTA cena se repetiu com muita freqüência durante os meses de abril e maio, em Ruanda, um pequeno país localizado na África Central. Na época havia 15 congregações das Testemunhas de Jeová em Kigali, capital de Ruanda, e nos arredores. O superintendente da cidade, Ntabana Eugène, era tutsi. Ele, a esposa, o filho e a filha de nove anos, Shami, estavam entre as primeiras pessoas chacinadas quando irrompeu o surto de violência.

Diariamente, milhares de ruandeses foram assassinados - por semanas a fio. "Nas últimas seis semanas", relatou em meados de maio a revista acima, "o número de mortos chegou a 250.000 numa campanha de genocídio e vingança que rivaliza com o expurgo sangrento do Khmer Vermelho, no Camboja, em meados da década de 70".

A revista Time declarou: "Numa cena que fez lembrar a Alemanha nazista, num grupo de 500 crianças escolheram-se algumas simplesmente porque pareciam ser tutsis. . . . Camponeses hutus deram ao prefeito da cidade sulina de Butare, que é casado com uma tutsi, [uma dolorosa] escolha: poderia poupar a esposa e os filhos se entregasse a família da esposa - tanto os pais como a irmã - para serem mortos. Ele concordou."

Seis pessoas, quatro hutus e dois tutsis, trabalhavam no Escritório de Tradução das Testemunhas de Jeová em Kigali. Os tutsis eram Ananie Mbanda e Mukagisagara Denise. Quando a milícia junto com saqueadores foram à casa, ficaram furiosos ao descobrir que ali hutus e tutsis moravam juntos. Eles queriam matar Mbanda e Denise.

"Eles começaram a puxar os pinos das granadas de mão que traziam", disse Emmanuel Ngirente, um dos irmãos hutus, "ameaçando matar-nos, visto que em nosso meio tínhamos os inimigos deles. . . . Queriam uma grande soma de dinheiro. Demos a eles todo o dinheiro que tínhamos, mas eles não ficaram satisfeitos. Decidiram levar, como compensação, tudo que pudessem usar, incluindo um computador laptop usado no serviço de tradução, uma fotocopiadora, rádios, sapatos, e assim por diante. De repente foram embora sem matar a nenhum de nós, mas disseram que voltariam."

Nos próximos dias, os saqueadores voltaram diversas vezes, e toda vez as Testemunhas hutus imploraram pela vida de seus irmãos tutsis. Por fim, quando se tornou perigoso demais para Mbanda e Denise continuarem ali, tomaram-se providências para que fossem com outros refugiados tutsis para uma escola nas redondezas. Quando a escola foi atacada, Mbanda e Denise conseguiram fugir. Conseguiram passar por diversos bloqueios na estrada, mas, por fim, em um dos bloqueios, todos os tutsis foram separados, e Mbanda e Denise foram mortos.

Quando os soldados retornaram ao Escritório de Tradução e descobriram que as Testemunhas tutsis haviam fugido, eles espancaram os irmãos hutus. Então um morteiro explodiu nas proximidades, e os irmãos conseguiram escapar com vida.

Com a matança contínua em todo o país, é possível que o número de mortos tenha chegado a meio milhão. Por fim, dos oito milhões de habitantes de Ruanda, entre dois e três milhões, ou mais, abandonaram suas casas. Muitos desses buscaram refúgio em dois países vizinhos, Zaire e Tanzânia. Centenas de Testemunhas de Jeová foram mortas, e muitas outras estavam entre os que fugiram para os campos de refugiados fora do país.

O que provocou tal chacina e êxodo sem precedentes? Poderiam ter sido evitados? Qual era a situação antes do irrompimento da violência?

Os hutus e os tutsis

A população tanto de Ruanda como do vizinho Burundi é constituída de hutus, um povo banto em geral entroncado e de estatura baixa, e de tutsis, normalmente mais altos e de pele mais clara, que também são conhecidos como watusis. Nos dois países 85% da população é constituída de hutus e 14% de tutsis. Há registros de conflitos entre esses dois grupos étnicos desde o século 15. Em geral, porém, eles têm convivido pacificamente.

"Convivíamos em paz", disse uma mulher de 29 anos sobre os 3.000 hutus e tutsis que viviam na aldeia de Ruganda, que fica a alguns quilômetros a leste do Zaire. Mas em abril os ataques-surpresa de gangues hutus eliminaram quase toda a população tutsi da aldeia. O jornal The New York Times explicou:

"A história dessa aldeia é a história de Ruanda: a convivência entre hutus e tutsis, casando-se entre si, não se preocupando, ou nem mesmo sabendo, quem era hutu e quem era tutsi.

"Daí aconteceu uma reviravolta. Em abril, as turbas hutus em todo o país irromperam em violência, matando tutsis onde quer que esses fossem encontrados. Quando começaram as matanças, os tutsis fugiram para as igrejas em busca de proteção. As turbas os seguiram, transformando santuários em cemitérios que continuam salpicados de sangue."

O que provocou a matança? Foram as mortes, num desastre aéreo, dos presidentes de Ruanda e Burundi, ambos hutus, ocorrida em Kigali, em 6 de abril. De alguma forma, esse episódio desencadeou a chacina não apenas de tutsis, mas também de quaisquer hutus que se supunha ter simpatia pelos tutsis.

Ao mesmo tempo, intensificou-se a luta entre as forças rebeldes - a FPR (Frente Patriótica Ruandesa), controlada pelos tutsis - e as forças do governo, controladas pelos hutus. Até julho a FPR havia vencido as forças do governo e obtido controle de Kigali e grande parte das outras regiões de Ruanda. Temendo represálias, milhares de hutus fugiram do país no início de julho.

Quem é responsável?

Quando se pediu a um lavrador tutsi para explicar por que a violência irrompeu subitamente em abril, ele disse: "É devido aos maus líderes."

De fato, no decorrer dos séculos, os líderes políticos espalharam mentiras sobre seus inimigos. Sob a direção do "governante deste mundo", Satanás, o Diabo, os políticos do mundo têm persuadido os do seu próprio povo a lutar e a matar os de outra raça, tribo, ou nação. (João 12:31; 2 Coríntios 4:4; 1 João 5:19) A situação não é diferente em Ruanda. O The New York Times disse: "Os políticos têm repetidamente tentado fomentar lealdade e temores étnicos - no caso dos hutus, para manter o controle do Governo; no caso dos tutsis, para organizar o apoio à frente rebelde."

Visto que as pessoas de Ruanda de muitas maneiras são parecidas, nunca se esperaria que se odiassem e matassem umas às outras. "Os hutus e os tutsis falam a mesma língua e no geral têm as mesmas tradições", escreveu o repórter Raymond Bonner. "Com a mistura dessas raças já por gerações, as diferenças físicas - os tutsis, altos e magros; os hutus, mais baixos e troncudos - desapareceram a tal ponto, que os ruandeses geralmente não têm certeza se alguém é hutu ou tutsi."

A recente enxurrada de propaganda, porém, tem tido um efeito inacreditável. Para ilustrar esse ponto, Alex de Waal, diretor do grupo Direitos Africanos, disse: "Os camponeses nas áreas dominadas pela FPR alegadamente ficaram espantados de que os soldados tutsis não têm chifre, rabo, e olhos que brilham no escuro - pois é isso que dizem os programas de rádio que escutam."

Não são apenas os líderes políticos que moldam a maneira de pensar do povo, as religiões também influem nisso. Quais são as principais religiões de Ruanda? São elas também responsáveis pela tragédia?

O papel da religião

A The World Book Encyclopedia (edição de 1994) diz sobre Ruanda: "A maioria da população é católica . . . A Igreja Católica Romana e outras religiões cristãs são responsáveis por quase todas as escolas primárias e secundárias do país." De fato, o jornal National Catholic Reporter chamou Ruanda de uma "nação 70% católica".

O jornal britânico The Observer dá os antecedentes históricos da situação religiosa em Ruanda, explicando: "Durante a década de 30, quando as igrejas lutavam pelo controle do sistema educacional, os católicos ficaram a favor da aristocracia tutsi ao passo que os protestantes se aliaram aos hutus, uma maioria oprimida. Em 1959, os hutus tomaram o poder e em pouco tempo tinham o apoio dos católicos e dos protestantes. O apoio protestante à maioria hutu continua sendo muito forte."

Têm os líderes religiosos protestantes, por exemplo, condenado os massacres? The Observer responde: "Perguntou-se a dois clérigos [anglicanos] se eles condenavam os assassinatos que encheram as naves das igrejas de Ruanda com os corpos de crianças decapitadas.

"Recusaram-se a responder. Eles se esquivaram das perguntas, ficaram agitados, ergueram a voz, e a raiz da crise de Ruanda foi exposta - os membros de maior destaque da Igreja Anglicana agindo como meninos de recados de patrões políticos que têm pregado o assassinato e enchido os rios de sangue."

Na verdade, as Igrejas da cristandade em Ruanda não são diferentes de suas equivalentes em outros lugares. Por exemplo, o general-de-brigada britânico Frank P. Crozier disse o seguinte sobre o apoio das religiões aos líderes políticos na Primeira Guerra Mundial: "As igrejas cristãs são os melhores fomentadores da ânsia de sangue que temos, e fizemos delas livre uso."

Sem dúvida, os líderes religiosos têm uma grande responsabilidade pelo que aconteceu. O National Catholic Reporter de 3 de junho de 1994, declarou: "O conflito nessa nação africana é 'um verdadeiro genocídio, pelo qual, lamentavelmente, até mesmo os católicos são responsáveis', disse o papa."

Obviamente, as Igrejas deixaram de ensinar os verdadeiros princípios cristãos, baseados em textos como Isaías 2:4 e Mateus 26:52. Segundo o jornal francês Le Monde, um sacerdote deplorou: "Eles estão matando uns aos outros, esquecendo-se totalmente de que são irmãos." Outro sacerdote ruandês admitiu: "Cristãos sendo assassinados por cristãos, depois de um século de sermões sobre amor e perdão. Isso denota um fracasso." O Le Monde perguntou: "Como alguém pode deixar de pensar que os tutsis e os hutus, que estão agora em guerra em Burundi e Ruanda, foram ensinados pelos mesmos missionários cristãos e freqüentavam as mesmas igrejas?"

Os verdadeiros cristãos são diferentes

Os verdadeiros seguidores de Jesus Cristo agem de acordo com sua ordem de 'amar uns aos outros'. (João 13:34) Consegue imaginar Jesus ou um de seus apóstolos pegando um machete e usando-o para matar alguém? Os que executam tal matança desenfreada são identificados como "filhos do Diabo". - 1 João 3:10-12.

As Testemunhas de Jeová não participam de nenhuma maneira em guerras, revoluções ou quaisquer conflitos promovidos pelos políticos do mundo, que são controlados por Satanás, o Diabo. (João 17:14, 16; 18:36; Revelação [Apocalipse] 12:9) Em vez disso, as Testemunhas de Jeová demonstram genuíno amor umas pelas outras. Assim, durante os massacres, as Testemunhas hutus se dispuseram a arriscar sua vida no empenho de proteger seus irmãos tutsis.

Tais tragédias, porém, não nos devem surpreender. Na profecia de Jesus sobre a "terminação do sistema de coisas", ele predisse: "Então vos . . . matarão." (Mateus 24:3, 9) Felizmente, Jesus promete que os fiéis serão lembrados por ocasião da ressurreição dos mortos. - João 5:28, 29.

No ínterim, as Testemunhas de Jeová em Ruanda e ao redor do mundo estão determinadas a continuar evidenciando que são discípulos de Cristo por amarem umas às outras. (João 13:35) O seu amor dá um testemunho, mesmo em meio às atuais dificuldades, como revela o relatório anexo intitulado "Testemunhas nos campos de refugiados". Todos precisamos lembrar-nos do que Jesus disse em sua profecia: "Quem tiver perseverado até o fim é o que será salvo." - Mateus 24:13.

[Quadro na página 29]

TESTEMUNHAS NOS CAMPOS DE REFUGIADOS

Em julho do ano corrente, cerca de 4.700 Testemunhas e pessoas que se associam com elas estavam em campos de refugiados. No Zaire, 2.376 estavam em Goma, 454 em Bukavu, e 1592 em Uvira. Além disso, havia cerca de 230 em Benaco, na Tanzânia.

Nem mesmo chegar aos campos de refugiados era fácil. Uma congregação de 60 Testemunhas tentou atravessar a ponte Rusumo, uma das principais vias de escape para os campos na Tanzânia. Visto que não tiveram permissão para passar, percorreram as margens do rio durante uma semana. Daí, decidiram tentar atravessar o rio de canoa. Conseguiram, e, após alguns dias, chegaram em segurança ao campo.

As Testemunhas de Jeová em outros países organizaram campanhas de ajuda em grande escala. As Testemunhas na França recolheram mais de cem toneladas de roupa e nove toneladas de sapatos, e, junto com suplementos alimentares e remédios, essas provisões foram enviadas para as regiões carentes. Com freqüência, a primeira coisa que os irmãos nos campos de refugiados pediam, contudo, era a Bíblia, a revista A Sentinela ou a Despertai!.

Muitos observadores ficaram impressionados com o amor demonstrado pelas Testemunhas do Zaire e da Tanzânia, que visitaram e ajudaram seus irmãos refugiados. "Vocês recebem visitas de pessoas de sua religião", dizem os refugiados, "mas nós não fomos visitados nem por um sacerdote da nossa Igreja".

As Testemunhas ficaram bem conhecidas nos campos, em grande parte devido à sua união, por serem ordeiras e terem disposição amorosa. (João 13:35) É interessante observar que em Benaco, Tanzânia, levou apenas 15 minutos para localizar as Testemunhas refugiadas dentre as cerca de 250.000 pessoas que estavam no campo.
     ENOQUE A.

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